segunda-feira, 31 de maio de 2010

Os pombos



Enquanto fazia um lanche no horário em que todos – ou quase todos – almoçam, sentada em um banco de uma praça, de repente minha dispersão foi interrompida por três pombos.
Como quem não quer nada, eles lentamente começaram a se aproximar. Ainda que desconfiados, a curiosidade deles parecia ser maior do que o receio de uma reação hostil de minha parte. E o interesse também. Afinal, fosse pelo cheiro do lanche ou pelas íntimas migalhas caídas no chão, o fato é eles resolveram apostar, mesmo sendo eu um ser estranho.
Inicialmente, não mexi um dedo nem fiz nenhum gesto amigável. De propósito, lógico, no intuito de instigá-los e, dessa forma, melhor observar seus comportamentos. Depois, devagar fui esticando as pernas. Um, que já estava mais próximo, recuou estrategicamente. E, sabem? Olhou diretamente para mim. Sei que posso parecer doida, visionária, sei lá... Ainda mais porque foi diretamente para os meus olhos.
Ali ficou quieto, apenas piscando e esperando um gesto meu. Nada. Eu me divertia com o fato. Com a minha aparente inércia, os outros começaram a se aproximar, devagar.
Pelo visto, o que estava mais próximo e me observava era o chefe. E a um sinal seu, os outros se aproximariam ou se afastariam.
Resolvi fechar os olhos para ver o panorama mudar quando os abrisse. Estava tão certa de que isso mudaria, que quase apostei intimamente. Certa? Claro que sim! Agora, ele, o chefe, estava no banco ao meu lado. E os outros dois praticamente nos meus pés.
Deslizei, o mais devagar que pude, as migalhas que estavam no guardanapo. O pombo no banco começou a comê-los. Depois, ao invés de ir embora, aproximou-se mais. Ora, pensei, teria ele visto em raio-X que em minha bolsa havia outras coisas que o interessavam?
O tempo havia se esgotado e eu precisava retornar. Levantei-me no mesmo instante em que ele voou. Mas, pelo visto, não queria apenas as migalhas do meu lanche, pois começou a caminhar à minha frente no passeio de areia da praça em direção à calçada, simulando um bailado como se estivesse fazendo um convite a uma estranha amizade.
Só levantou voo quando acelerei o passo, acenando para o ônibus que se aproximava do meio fio.
Voltei à mesma praça e ao mesmo banco no dia seguinte. Desta vez, com um pacote de guloseimas especialmente atraentes para pombos.
Foi só sentar e aguardar poucos minutos de olhos fechados, pois tinha certeza de que quando os abrisse, ele estaria lá.
E estava. Agora, de segundas as sextas, temos encontros agendados.
Rosane Leiria Ávila
Jornal Agora



Nenhum comentário:

Postar um comentário