Ao longo da vida nos deparamos com muitos ‘fantasmas’. Alguns colecionamos por anos a fio até que uma terapia apague suas impressões. Outros, vão surgindo em nosso dia a dia e preenchem as páginas de nossa agenda com aquilo que anotamos e não damos conta de fazer. Um comum a muita gente é o fantasma do salário que não se estica feito elástico até o final do mês. Outro é aquele que ganha corpo pelo medo de ir a um médico e ele pedir uma porção de exames, e que depois de ser abatido cederá seu lugar a outro emergido pelo receio de um resultado inesperado. Não devemos nos esquecer também de listar aquele velho fantasminha infantil que nos assombrava com o medo do dentista e sua maquininha de dor estridente...
Há ainda os fantasmas da corrupção, da roubalheira do dinheiro público e dos maus políticos. Da decepção do voto dado pra quem não está fazendo por merecê-lo. Do medo da violência na rua, no banco, no trânsito... O fantasma da competitividade que dá ímpetos a um colega de arrancar o fígado do outro no seu ambiente de trabalho.
E, ultimamente, do fantasma do tempo. Não o tempo que nos deixa mais velhos a cada dia e do qual não podemos, e não queremos fugir; caso contrário, precisaríamos morrer. Falo desse tempo-clima maluco que faz a temperatura despencar mais de 10 graus em menos de 24h. Que nos palhaços urbanos vestidos para verão e inverno, com filtro solar e guarda-chuva. Outro dia, uma moça de São Paulo comentou que saía de casa às 6h da manhã com roupa de inverno por causa do frio. Mas na mochila carregava vestuário de meia estação, de verão e até biquíni, porque no final do dia poderia estar muito quente e assim ela poderia dar uma passada no clube antes de retornar à sua casa.
Afora esse fantasma doido e trapaceiro, ela também tinha outros, como o do trânsito emperrado e o de enfrentar um temporal na rua com direito a enxurradas e tragédias.
Ah, são muitos os fantasmas cotidianos, alguns extravagantes, excêntricos, idiotas, absurdos! A parte boa disso é que com o tempo vamos ganhando tarimba para lidar e abater alguns. Os mais resistentes e encouraçados viram verdadeiros monstros com poder de fogo para roubar o brilho, o sorriso, a leveza e a despreocupação dos semblantes mutando-os em caricaturas carrancudas...
Por fim, meus mais recentes fantasmas são crias desse inverno chuvoso e frio. Eles me fazem lembrar uma infância povoada por roupas molhadas estendidas no varal do pátio por vários dias, que brincavam com meu imaginário ao se moverem ao comando do vento. Ou quando bruxuleavam na sombra das luzes à noite.
ROSANE LEIRIA ÁVILA
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