Vilão, vilãs... Há histórias para contar sem a presença deles? Praticamente impossível. Pelo menos eu não consigo lembrar alguma. Seja em telenovela, livro, cinema ou peça de teatro e até mesmo em letras musicais. Parece que há sempre uma balança onde o bem e o mal deve ser pesado. Os bons de um lado e os ruins do outro.
Embora algumas histórias – famosas por sinal -, elejam apenas um vilão e nele centre todo o enredo da trama, o que se percebe atualmente é que essa fórmula está ficando em desuso. Ou não estava mais surtindo efeito, pois o que se tem assistido é uma profusão, ou melhor, uma salada de vilões em um mesmo folhetim. Vejam o exemplo da novela “Caras & Bocas”, de Walcyr Carrasco. Mãe, filha, filho, ex-namorada, pai dela e outros tantos que se movimentam apenas no intuito de praticar o mal contra a mocinha da trama, interpretada por Flávia Alessandra.
Isso nos deixa confusos quanto ao recado que o autor quer passar... Poderia ser a mensagem de que o mundo é deles? A beleza e o sucesso também? E o carisma? A boa moça ou o bom rapaz se tornaram chatos, insípidos? Excetuando-se as velhas histórias infantis onde a bruxa era feia, velha, desdentada e cheia de verrugas, as malvadas de hoje possuem beleza e ambição social e intelectual, pois são esses as chamas da vaidade que alimentam o ego. E o ego cobra sempre mais de quem tem uma baixa auto-estima. Por mais contraditório que isso possa parecer.
Em um passado ainda recente, o Brasil assistiu as maldades da personagem Flora, interpretada magnificamente por Patrícia Pilar na novela “A Favorita” da Globo. Nos capítulos finais quase se sublimou as maldades dela, tamanho foi o seu carisma. A personagem se valeu da beleza e da escolha de um visual impecável no vestir, tornando agradável a visão da sua imagem. Foi uma química perfeita. Enquanto mocinha, na primeira parte da trama, era o típico patinho feio.
Em “O Bem, o Mal e mais Além”, o psiquiatra e escritor Flávio Gikovate faz uma reflexão entre os generosos e e os egoístas, leia-se bons e maus, e como um olhar mais aprofundado sobre os dois nos faz perceber que, por vezes, há uma linha tão tênue entre eles que se torna extremamente difícil estigmatizá-los. “O bem e o mal não são entidades afetivas; são construções, quase mitos, que foram elaboradas ao longo dos milênios e, de certa forma, transformadas em uma dualidade tida como inevitável. Deus e o Demônio lutam e lutarão para sempre! Assim, o bem depende do mal para se definir e ter existência, da mesma forma que o mal é definido por comparação com o bem”, diz Gikovate.
Devemos deixar de nos comportar como viciados das sensações que adulam o nosso ego. Há uma saída para nós reagirmos ao mal, deixando-o refém dos folhetins. O próprio Gikovate aponta a direção: “É preciso muita força interior para resistir às pressões que sofremos para aderirmos às tentações. Precisamos estar conscientes e atentos o tempo todo.”
Rosane Leiria Ávila (publicado no caderno Mulher Interativa, do Jornal Agora, www.jornalagora.com.br, ed. 16 e 17 de maio de 2009)